Para não sermos soterrados por informações, a tecnologia nos oferece filtros que, de modo algum, são agentes neutros. Ao navegar nas redes, mal nos damos conta de como somos “observados”, de quanto nos procuram caracterizar, fazendo inferências sobre nossos desejos, que se situam na antessala de nossos projetos. Se circunstancialmente comprei um livro sobre degustação de vinhos, daí por diante serei considerado potencialmente um enólogo. Certa vez, recebi um email escrito parcialmente em russo, enviado por um primo que trabalhava temporariamente na Rússia; até hoje, de quando em quando, alguns emails me oferecem, em russo, produtos ou leituras que nunca solicitei. Os sites que buscam realizar tal conformação, ou tal inventário de interesses são constituídos por algoritmos que funcionam da maneira mais conservadora possível. Segundo eles, se ontem não choveu e hoje não choveu, amanhã não irá chover. No que tange às redes sociais, tal raciocínio conformista produz um efeito colateral terrível, já percebido pelos estudiosos da chamada (impropriamente) “inteligência artificial”. O artigo Redes sociais forma “bolhas políticas” (Jornal OESP, 27/03/2016) analisa tal questão. Como tais redes filtram e amplificam o que é relevante para determinado grupo, isso produz a sensação de que todo mundo concorda com o participante, e frequentemente os desacostuma de um diálogo com defensores de posições opostas. Tal fato, quando insistentemente alimentado, pode situar-se na origem dos dogmatismos dos que acreditam que existe uma única história a ser contada, ou com os sempre nefastos extremismos dos que apostam numa divisão dicotômica do mundo entre quem está conosco e quem está contra nós: nenhum terreno é mais favorável à semeadura da violência.
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