Diversas pesquisas apontam que a vigência de programas de cotas ou de bônus, em processos seletivos para ingresso no ensino superior, não altera significativamente a qualidade dos formandos. Tal fato tem servido de argumento para os que defendem tais programas; eles também podem servir de base, no entanto, para uma crítica oportuna aos exames vestibulares existentes entre nós. O grau de especificidade, o nível de pormenor, a perda de foco nas ideias fundamentais de cada um dos conteúdos disciplinares estão a exigir que sejam repensados drasticamente tais exames. Na forma atual, eles constituem obstáculos a serem ultrapassados… e esquecidos. A vida acadêmica e o exercício profissional passam longe do bom desempenho em tais maratonas, que servem quase exclusivamente aos interesses mercantis dos cursinhos e das fundações universitárias que as exploram. No caso de São Paulo, chega-se ao absurdo de exigir dos vestibulandos que se submetam a três exames distintos, se desejarem ingressar em uma das três grandes universidades públicas, como se fosse impossível a convergência para um processo seletivo apenas. O curioso é que, após ingressar em uma delas, os alunos têm exigências mínimas, racionalmente fixadas, para o aproveitamento de créditos obtidos em suas coirmãs, sobretudo nos cursos de pós-graduação… Voltando aos exames vestibulares, inúmeras pesquisas, como as inicialmente citadas, também registram a ineficácia de seu poder preditivo do desempenho dos alunos, ao longo dos cursos universitários. Os registros de abandono de curso ou de infelicidade nas opções precocemente realizadas, mesmo em cursos tradicionais como engenharia ou medicina, são abundantes. Já houve um momento, ao longo da década de 1970, que um professor do Instituto de Física da USP sugeriu a simples eliminação dos exames vestibulares, que seriam substituídos pelo mero sorteio entre os candidatos inscritos. Apesar de não ter sido levado a sério, arrisco a previsão de que as pesquisas realizadas a posteriori também indicariam que as diferenças de desempenho dos formandos não seriam significativas. Não se trata aqui, obviamente, de desprezar o mérito e delegar a seleção ao acaso: trata-se, isto sim, de apontar para o verdadeiro foco da ineficácia: o vestibular. Trata-se de compreender que as pesquisas citadas no início apenas registram que a geladeira-vestibular não está funcionando bem, que os alimentos estão em vias de se estragar, ainda que ela possa estar servindo para aquecer um par de tênis-cota umedecido, acolhido circunstancialmente em sua parte traseira.
*******SP 15-11-2016
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