“Ontem não choveu, hoje não choveu, portanto amanhã não vai chover”; eis o que se poderia chamar de Teorema da Chuva. Uma evidente bobagem do ponto de vista da Lógica. Um desvario similar seria, após dois lançamentos de um dado em que foram obtidos sucessivamente os números 1 e 3 na face superior, concluir que no próximo lançamento obteremos o número 5. Uma inferência sobre o resultado de um evento pode decorrer de um de dois caminhos fundamentais: a dedução e a indução. A dedução sempre se realiza no âmbito de um sistema formal, a partir de algumas proposições aceitas incondicionalmente (os postulados do sistema), recorrendo-se a instrumentos lógicos que garantem padrões inexoráveis de interconexões. Já a indução trata do estabelecimento de condições para a generalização de um resultado, constatado em ocorrências específicas. Ainda que numerosas, tais ocorrências não garantem uma generalização afoita, como no Teorema da Chuva supra referido. Filósofos empiristas, como Bacon, buscaram estabelecer critérios aceitáveis de generalização; outros, racionalistas, na linha de Popper, negaram veementemente a possibilidade de existência de tais critérios, no âmbito do conhecimento científico. Uma terceira corrente, em que se pode situar Peirce, propõe a existência de um terceiro movimento, entre a indução e a dedução, que seria a abdução. Se, para Popper, a indução não existe como problema científico, e o escopo da ciência é o de formular teorias e colocá-las à prova, não fazendo sentido, digamos, uma “psicologia da invenção de teorias”, para Peirce, a formulação de hipóteses a serem testadas decorre de um movimento criativo do pensamento que ele batizou de abdução. Sem tal movimento, a ciência não progrediria. O termo criado por Peirce, no entanto, não alçou voo e a ciência permaneceu, até hoje, na busca do encontro entre a indução e a dedução. Alegoricamente, a ciência se dedica a contar as sementes que existem no interior de um fruto – eis o escopo da dedução. Fundamental, no entanto, é contar os frutos que dormem no interior de uma semente: eis aí o terreno da indução. A ciência tem pouco, quase nada a nos dizer a esse respeito. Mas insiste, popperianamente, em afirmar que o problema da indução não faz sentido.
********SP 06-01-2017
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