Na vida em sociedade, a coação, ou a ação sobre os outros, é necessária. Embora a ideia de coação pareça sempre indesejável, existe a coação legítima, diretamente associada ao cumprimento das leis. A lei nos coage a todos, e gostamos disso. Existe também a coação associada ao exercício da heteronomia, como instrumento necessário para a passagem da anomia à autonomia. E existe, naturalmente, a coação ilegítima correspondente à coerção, ao exercício da força, que é sempre indesejável, embora nem sempre evitável.
O contrato social que organiza a vida em sociedade reserva ao Estado o monopólio do uso da força. Tal deferência está diretamente associada à responsabilidade do Estado no estabelecimento de uma ordem pública que garanta proteção ao cidadão. Naturalmente, estamos falando do Estado de Direito, legalmente constituído para o exercício do Poder. A estrutura do Poder deve ser tal que a coação que dele decorre seja consentida. A tripartição do Poder (Executivo, Legislativo, Judiciário) é apenas um dos requisitos básicos para tal consentimento. A fundamentação na Justiça é, sem dúvida, o mais importante de todos os requisitos. Já se disse que, sem tal fundamentação, não há distinção entre um Estado e um bando de ladrões.
O exercício do Poder é tarefa para uma Autoridade, que assume a responsabilidade pela ação sobre os outros. Além da Força disponível para o garantir o exercício do Poder e do consentimento associado ao fato de tal Poder ser legalmente constituído, a Autoridade necessita de legitimidade, o que está associado ao modo como ela chegou ao Poder. Em um Estado de Direito, existem normas legais que conduzem o processo de constituição dos governantes; se elas não existem, são violadas ou não parecem justas, a Autoridade é minada. Eleições não instituem uma Autoridade, mas apenas legitimam uma Autoridade potencial que já existia.
Completa-se, assim, a tríade: Força, Poder, Autoridade. Quando a Autoridade é minada e se torna ilegítima, ainda resta o Poder; quando as estruturas do Poder sofrem abalo, resta apenas a Força. Tal é o caminho percorrido em um movimento como a Revolução Francesa. O mero exercício da Força nunca pode aspirar a uma situação de estabilidade, sendo sempre transitório. Similarmente, a manutenção do Poder quando a Autoridade se esvaiu em geral dura pouco.
******SP 22-04-2017
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