Em certos ambientes, sobretudo acadêmicos, a aparente bifurcação materialismo/idealismo não parece um dilema: o materialismo ganha de goleada.
Com percuciência e humor, J. L. Borges examina a questão em um de seus mais inspirados contos (Tlön. Ukbar. Orbis Tertius). Em Tlön, a vida não pressupõe a ideia de substância. Na língua natural não existem substantivos. Para representá-los, recorre-se aos verbos, ou seja, às ações que são realizadas sobre eles, ou então, às qualidades inerentes aos objetos. Em vez de “a lua apareceu no céu”, diz-se “luneceu”, ou então, “a redonda brancura brilhante surgiu”; os objetos são percebidos pelas ações que os sujeitos realizam sobre eles, ou como um feixe de qualidades que lhes são atribuídas. Em tal imagem do mundo, percebido como uma complexa rede de nós e relações, a causalidade linear não desempenha papel decisivo.
Assim, da aparência do mais extremado idealismo, somos conduzidos à ideia de rede, um dos mais fecundos modelos da realidade concreta.
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